18 de abril de 2009

Em tempos de celeridade processual, vale a objetividade.

Recebi semana passada interessante notícia através da lista de e-mails funcionais da Procuradoria, acho que reflete bem a necessidade recorrente de objetividade nas petições e outras peças processuais dirigidas ao Poder Judiciário.

Enfim, para fazer o direito é preciso técnica, mas processo judicial não é o foro adequado para demonstração exacerbada de erudição e notável cultura jurídica.

JUIZ MANDA ADVOGADO ESCREVER MENOS!

Número DataTexto 2485/2008
29/12/2008

3ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de Porto Alegre

Nota de Expediente Nº 2485/2008 001/1.08.0342615-5 - SINDIPOLO - Sindicato Trabalhadores Indústrias Petroquímicas Triunfo (pp. Cesio Sandoval Peixoto) X PETROS - Fundação Petrobrás de Seguridade Social (sem representação nos autos). Recebo, por dia, cerca de 15 novas petições iniciais, a maioria com pedido de antecipação de tutela. Some-se a isso que tramita, em toda a Vara, algo em torno de 13 mil processos, o que faz com que me venham a despacho, por dia, algo na média de 350 processos. Essas são razões sobejas que me impedem de ficar lendo uma inicial, como a ora apresentada pela parte autora, de 130 folhas (maior do que muito livro ou monografia de mestrado, que andam por aí), com 17 pedidos de antecipação de tutela. As partes têm que ter a necessária consciência de que o Juiz é um ser humano, de quem se exige célere prestação jurisdicional, que não pode ficar se 'deleitando' em ler extensas iniciais.

Além disso, a pronta e satisfatória prestação jurisdicional só será eficaz se os advogados, compreendendo que a essencialidade que a CF lhes garantiu serve para auxiliar na administração da Justiça, deduzindo pretensões claras, objetivas, sintéticas.

DETERMINO QUE A PARTE AUTORA emende a sua inicial, em 10 (dez) dias, aclarando-a, resumindo, em 5 folhas, qual é, afinal, a tutela jurisdicional final buscada nesta ação (ou seja, quais os pedidos) e quais antecipações de tutela pretende (se totais ou parciais). Esclareça, também, se não seria caso de litisconsórcio necessário.

Porto Alegre.

15 de abril de 2009

Direito e linguagem: porque essa relação é tão difícil e cada dia mais necessária?



Li recentemente uma entrevista com o Prof. Antonio Luis Chaves Camargo, da Faculdade de Direito da USP, sobre uma visão bem particular do Direito, mais detidamente do Direito Penal, que revela uma feição bastante interessante sobre a correspondência das disposições legais sobre o crime e a realidade do país, do operador jurídico e do criminoso.
Uma das frases soltas na reprodução da entrevista me chamou bastante atenção: "O crime é uma ficção lingüística. O crime não existe e a verdade também não existe. A verdade é argumentativa".


A compreensão do que o Prof. Chaves quis afirmar com tal assertiva de início me levou a achar que ele faria parte da "moderna" corrente "garantista" do direito penal (a qual eu tenho reservas), para quem o acusado deve ter garantias formais e materiais dignas, o que fundamenta inclusive os princípio da intervenção mínima e insignificância tratados outro dia um post aqui do blog.


Pois para minha surpresa, o professor, pelo menos nessa entrevista, não se inseriu nessa perspectiva garantista, passando a fazer considerações sobre duas fases do processo penal, a primeira até a condenação (onde deveriam ser conferidas as garantias do processo democrático) e a segunda da execução penal (onde o rigor da aplicação da pena não pode admitir privilégios, reduções ou outros benefícios que tornem "brando" o cumprimento da sanção).


Nessa linha defende o entrevistado:


“Se a pessoa não quiser se recuperar, pode fazer 15 anos de terapia, que não vai adiantar. Por isso acredito que o ser humano tem que responder, de acordo com a lei, pelas conseqüências dos seus atos”.


"O preso é recuperável? Não! É reeducável? Não! Tem reinserção social? Não! Para que serve a pena? Para nada... Só serve como restrição à liberdade de quem praticou um crime"

O interessante nessa aparente contradição (aparente por que é preciso situar cada condição - a de processado e a de condenado) é que o professor Chaves expõe a crise do sistema processual penal no país, do juiz como operador do direito e do próprio ensino jurídico no Brasil como uma decorrência da confusão entre moral, ética e direito, para ele - as pessoas imaginam que ética é uma série de preceitos que devem ser seguidos por todos, e estes preceitos levarão as pessoas à felicidade. “Pura ilusão...”.

O que parece ser uma visão pessimista da aplicação do Direito revela-se, em verdade, uma visão realista, e, para tanto alerta o professor:



“Se nós não tomarmos consciência do fracasso do ensino jurídico no Brasil, da falta de cultura, não tivermos consciência que temos que mudar tudo isso, abandonar o Direito clássico antigo e enveredarmos para o Direito moderno, no Direito Penal e no Direito em geral, vamos perder a legitimidade cada vez mais e vamos chegar a um ponto em que ninguém mais vai acreditar na Justiça."
Resta saber que modernidade é essa?



Como exemplo, o entrevistado aponta um caso prático: “No tempo que eu era juiz de menores, uma vez houve um grupo de senhoras que me procurou para proibir o beijo na novela ‘O Bem Amado’. Eu sugeri mudar o canal ou desligar a televisão”, isto ocorreu nos anos oitenta.


Inclui-se como elemento central na análise dos temas tratados pelo professor Chaves a relação direito-linguagem, o que fica evidente na afirmação: "Não existe verdade. A verdade é argumentativa".

Sem aprofundamentos, até por ausência de suporte doutrinário suficiente, o que me pareceu importante foi a forma como o professor aponta a gravidade do abismo existente entre a lei e a realidade linguística dos que se sujeitam ao Direito Penal, e como isso passa diretamente pelo ensino do Direito e a difusão do discurso jurídico na sociedade. Resumindo: Não estamos falando a mesma língua!

Por isso mostra-se cada dia mais necessária a apreensão e discussão, de forma séria e apropriada, dos conceitos terminológicos próprios do Direito à luz de uma semiologia jurídica (significação dos diversos institutos e de sua formação no ordenamento), tanto no ambiente acadêmico quanto na mídia de massa, sob pena de aprofundarmos esse fosso entre a abstração do texto normativo e a sua efetiva aplicação, o que contrinbui para o descrédito no sistema de Justiça e das instituições incumbidas de tal tarefa.

3 de abril de 2009

Sobre a reunião do G20... Macaco Simão explica.

"O G20 parece o terminal da TAM em Paris! No G7 servem canapé. No G20, coxinha! E o Obama vai explicar como os EUA viraram país socialista. Tão socializando o prejuízo com o resto do mundo."

Frase da semana

"A felicidade é qualquer coisa que depende mais de nós mesmos, do que das contingências e das eventualidades da vida."
Júlio Dantas

Um exemplo de como garantir a liberdade e transparência na imprensa brasileira.

Nesta semana saiu a publicação de importante sentença, disponível em pdf. no endereço: http://colunistas.ig.com.br/luisnassif/files/2009/03/sentenca_euripedes_x_nassif.pdf, prolatada nos autos do processo movido pelo grupo Civita (editor da revista Veja) contra o jornalista Luís Nassif.

Proferida pelo juiz Carlos Henrique Abrão, da 42ª Vara Cível de São Paulo, a decisão é digna de aplausos da comunidade jurídica e de toda a sociedade à medida que se fundamenta em um dos bens mais caros ao Estado Democrático de Direito, qual seja a liberdade de imprensa.

Fazendo um breve resumo do caso, pretendia a Veja uma indenização por danos morais no valor de R$100.000,00 do jornalista, por considerar arranhada a sua imagem perante a opinião pública com a divulgação no blog do réu, no final de 2007 e início de 2008, uma suposta vinculação entre as matérias da revista e o banqueiro Daniel Dantas. Não sou de ficar elogiando ou criticando sentenças em função de tal ou qual parte vencedora ou vencida, mas a decisão mencionada é de uma lucidez e consciência que merecem registro. Vejamos alguns pontos esclarecedores consignados pelo juiz Carlos Henrique:

A liberdade plena de imprensa, maior conquista das democracias ocidentais, observa o ângulo da transparência, seriedade e compromisso com a verdade. Difícil manter a harmonia quando interesses econômicos, políticos, sobretudo empresariais, sem sobra de dúvida, flexionam os limites da ética e da moralidade da imprensa.

Desenhada a arquitetura da lide, o seu ambiente divergente, feito o bosquejo do essencial, e tendo em mira a mudança de mentalidade surgida com a guerra midiática dos informes eletrônicos, blogs, equipamentos disponíveis, sopesando, um a um, todos os aspectos, a prova amealhada não permite, salvo melhor juízo, o acolhimento desta ação. Explicando a procura de justificativa, embora forte e contundente na sua crítica, Luis Nassif se cercou do contexto que tinha em suas mãos para escrever a matéria e não patinar nas informações, abordou assunto próprio de sua característica e o desagrado, como não poderia deixar de ser, fora generalizado.

No entanto, o jornalista não está obrigado a agradar, o fundamental, assinale-se uma vez mais, dependerá da investigação em andamento, a cargo da autoridade competente, no modo de ver do réu, se alguns jornalistas da Veja tinham contato com o banqueiro, seus escritos somente poderiam contar com a anuência do diretor de redação. E neste sentido, segundo se extrai de fonte segura, teria constado no relatório da Policia Federal capitulo especial dedicado às relações do banqueiro com a mídia, ou seja, em outras palavras, a exposição não desbordou os lindes exigidos pela Lei maior e de imprensa. Não houve qualquer dolo especifico de querer ferir suscetibilidade, tanto que na sua fala derradeira, o próprio réu reconhece, nenhuma intenção de ofender, expressa preocupação com a verdade. Deveras pode ter se precipitado ao estampar a matéria sem prévia consulta, mas seria ingenuidade pressupor que haveria confirmação, douto ângulo, sem findar a investigação e esmiuçar toda a teia multifacetária das alianças, não se pode concluir que houve despautério ou mesmo ofensa à honra do jornalista.

Inexistente o dano moral,faltante nexo causal, a demanda comporta o insucesso, isto porque a matéria nela ventilada,apesar de representar conteúdo forte, frutificou pensamento ao longo do tempo, irradiado porfatores e circunstancias formadoras da análise jornalística. E, se a lide é julgadaimprocedente, sendo os contendores patrícios, no mínimo esperamos que cerrem fileiras,ainda que ocupem trincheiras distintas, com suas invulgares inteligências, em prol da sociedade, da informação responsável e, sobretudo no aprimoramento e aperfeiçoamento da informação, para consolidação democrática, preenchendo a imprensa seu papel verdadeiro.

É isso, tomara que a lucidez presente nos fundamentos acima reproduzidos também estejam presentes nas mentes dos ilustres Ministros do STF ao julgar, por esses dias, a constitucionalidade de alguns dispositivos da Lei de Imprensa.

O que não se pode esquecer é simples: não há democracia sem imprensa com liberdade de expressão.