29 de dezembro de 2008

Adeus ano velho.

"O ano que alvorece é sempre recebido entre palmas e beijos, ao passo que o ano que descamba na eternidade vai acompanhado de invectivas e maldições." Machado de Assis


É isso amigos, como na passagem machadiana acima, o ano novo sempre é esperado com muitas expectativas boas, renovação de esperanças, crença em um futuro melhor para nós, nossos próximos e para todos, enquanto que o ano findo acaba sendo uma espécie de "enterro" de momentos desagradáveis, e, ainda quando lembramos das coisas boas que aconteceram nos seus 12 meses, sempre buscamos referências para outros progressos no ano vindouro, o que é natural.


Não é o intuito do último post do ano fazer uma espécie de retrospectiva sobre os fatos importantes de 2008, mas alguns são dignos de registro para que possamos ficar atentos em 2009, vejamos:


1- As eleições para prefeitura do Recife mostraram que a estratégia multifacetada da oposição ao grupo de João Paulo não surtiu efeitos, nem pra levar a decisão pro segundo turno; (veremos se o prefeito eleito e a Câmara renovada trabalharão para concretizar suas propostas de campanha e mostrarão uma gestão mais transparente e menos marcada por escândalos no uso de recursos públicos, e.g. uso de notas frias nos gabinetes dos vereadores, contratações milionárias de shows pirotécnicos e obras contestadas pela população, etc...).

2- Terá a Ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, condições de consolidar-se como candidata do PT às eleições presidenciais de 2010? (É de se notar que mesmo com o apoio do Presidente Lula e com a inauguração de inúmeras obras do PAC programadas para 2009, os reflexos da crise financeira desembarcaram no Brasil com força maior do que a gripe esperada, o vírus já está incubado, mas até agora só alguns espirros se manifestaram, aguardemos a sucessão dos fatos). Uma coisa é certa, caso ela se firme como candidata estará configurada a situação ideal para Lula, se ela perder, quem perdeu foi ela mesma, considerando sua pouca expressividade política, se ganhar, podemos afirmar que o Presidente conseguiu eleger um poste.


3- A eleição de Barack Obama nos Estados Unidos foi um fenômeno histórico muito importante na atual conjuntura sócio-econômica mundial e particularmente na cultura americana marcada pela segregação racial. Tudo bem, eu sei, Obama não é o Messias nem a Casa Branca a terra prometida (acho que estão longe disso). Mas, e ai? Terá o presidente eleito condições para mudar o trágico panorama herdado após 08 anos de Bush? Há apoio suficiente no Congresso norte-americano? As medidas anti-crise como os grandes pacotes para salvamento de empresas ineficientes e mal geridas conseguirão deter o desemprego? A Casa Branca e a secretária de Estado Hilary Clinton terão algum êxito nas negociações de paz entre palestinos e israelenses? (que estão terminando o ano de forma sangrenta com os ataques do Hamas e a resposta de Israel). Essas e muitas outras respostas, seguramente, não serão conhecidas em 2009, mas as providências a serem tomadas no ano que se aproxima serão decisivas para os próximos.


4- O ano que termina foi decisivo no direcionamento do STF como Corte constitucional, conforme o padrão europeu, a regulamentação e aplicação dos institutos da repercussão geral e a súmula vinculante; a interessante composição atual do tribunal; o destaque da imprensa aos casos midiáticos discutidos e julgados no ano (Raposa Serra do Sol, anencéfalos, células-tronco, nepotismo no legislativo, habeas corpus do DD e inquérito de um Ministro do STJ, etc...) Essa transformação parece inexorável, quem viver verá, mas acho que 2009 deve ser um ano para ficarmos em alerta com relação à concentração de poderes na Corte.
5- O Congresso Nacional vai voltar a trabalhar efetivamente e fazer as tão propaladas reformas política e tributária? Como todos estamos carecas de saber, e isso foi uma das causas do fortalecimento da judicialização da política, o Poder Legislativo federal não tem conseguido desempenhar com o mínimo grau de satisfação os anseios dos eleitores. Seja por excesso e medidas provisórias (resultantes da ineficiência do próprio CN e do voraz apetite legislativo do Executivo), seja pela transformação das casas congressuais em delegacias de polícia e juízos criminais com a explosão midiática de CPI´s sem começo, meio e fim, ou mesmo pela falta de compromisso de parlamentares e partidos preocupados com interesses mesquinhos que apequenam seus mandatos e a nobre função legislativa, o fato é que após a reprovação da cláusula de barreira e o sólido entendimento do STF em relação à fidelidade partidária, se a Câmara e o Senado não mudarem de postura em 2009, estará aprofundado o fosso entre os poderes, o que não é nada bom aos olhos da democracia. Afinal, não é de harmonia entre as funções de poder que Montesquieu falava?

Outros fatos importantes de 2008 também mereceram destaque, seja no esporte, na ciência, na música, na literatura, etc... mas deixo que os amigos leitores do blog registrem os fatos que mais lhe chamaram a atenção nos comentários.

Esperemos 2009 com muita alegria, esperança, saúde, mas não só esperemos, pois, como diz o trecho da canção que inspira o título do blog "quem sabe faz a hora não espera acontecer".

Feliz Ano Novo / Happy New Year / Bonnee Anée / Próspero Año Nuevo / Felice Anno Nuovo

24 de dezembro de 2008

Esse jogo é genial

Segue a dica de um passatempo divertido e inteligente.

Recebi por e-mail essa semana um joguinho da web http://pt.akinator.com/# em que é possível imaginar o nome de um personagem (qualquer um que venha a sua cabeça) e testar a capacidade do gênio (Akinator) em descobrir o que ou quem você imaginou.

É impressionante, joguei várias vezes e o gênio só errou em três delas, porém, difícil imaginar quem seriam as figuras, a Cuca (sítio do pica-pau amarelo), Zé trovão (antigo personagem da novela pantanal) e o cão Rabugento de um desenho antigo que eu assistia quando era criança.

Vale a pena jogar e testar o Akinator, pra ter uma idéia ele acertou personagens que eu achei difíceis como Lenine, Miguel Reale e Giuseppe Garibaldi.

Divirtam-se.

E aproveitando o ensejo, feliz natal e um 2009 cheio de paz, saúde, alegrias, sucesso e realizações para os leitores do blog (são poucos, mas são companheiros).

Acreditando em dias melhores é que temos a esperança necessária para mudar um pouco a cada dia.

Utopia e Carpe Diem esse é o lema!

15 de dezembro de 2008

O fim da prisão do depositário infiel inaugura o Estado constitucional internacionalista?


Tenho lido notícias e artigos sobre a conclusão do julgamento do RE 466.343/SP no STF, sobre a inconstitucionalidade da prisão do depositário infiel sob qualquer modalidade (contrato de depósito, arrendamento mercantil e depósito judicial) que trazem importantes questionamentos sobre o possível nascimento de um novo modelo de Estado, o constitucional internacionalista ou transnacional.

Um deles é assinado pelo criminalista Luis Flávio Gomes, disponível do JusNavigandi (http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12081) onde é defendida e difundida a idéia da necessidade da "morte" ao juiz legalista sob o fundamento de que o operador jurídico "moderno" deve ter consciência de que a lei é apenas um instrumento onde imperam as normas constitucionais e os tratados internacionais, especialmente os que versem sobre direitos humanos, ressaltando ainda a existência do princípio pro homine, como vetor interpretativo em casos que tais.

Destaco os três últimos parágrafos do texto, que trazem, em suma, a idéia do posicionamento adotado pelo autor, inclusive com os "jargões" pejorativos imputados ao chamado juiz legalista, vejamos:

"O Direito, como se vê, não se confunde com a lei. Ele começa com o constituinte e termina com a jurisprudência dos tribunais (nacionais e internacionais). A lei é uma parte desse oceano. Pode ser válida ou não: tudo depende da sua compatibilidade com as normas superiores (internacionais e constitucionais).

Convenhamos: nenhum jurista no Brasil pode ignorar a histórica decisão do STF de 03.12.08: essa data tornou-se muito importante para nós. Não só porque acabou com a prisão civil do depositário infiel, senão, sobretudo, porque inaugurou um novo modelo de Estado, de Direito e de Justiça: o constitucional internacionalista.
Isso implica que o juiz já não pode se contentar em conhecer apenas as leis e os códigos. Esse modelo de juiz (legalista positivista) está morto. Será cada vez mais reconhecido como jurássico (ou dinossáurico). O que se lamenta (em pleno século XXI) é que ele está morto mas não foi (ainda) sepultado! A atual (assim como as futuras gerações) conta com o dever de extirpar do nosso mundo jurídico esse juiz legalista. Marcação sob pressão nele, esse é o nosso desafio! O STF fez a parte dele. Todos os demais operadores jurídicos, agora, devem fazer a sua, posto que é assim que caminha a humanidade."

Bom, a afirmação de que o Direito não se confunde com a lei não constitui qualquer novidade, assim como a constatação de que o juiz cria o direito a partir da interpretação dos textos normativos e construção da decisão no caso concreto, como afirma Cappelletti em "Juízes legisladores?", mas a verificação in concreto de casos que indiquem a intensificação dessa perspectiva é suficiente para dizer que se inaugura no Brasil um novo modelo de Estado de Direito? E que esse modelo é o constitucional internacionalista? Em que consiste esse modelo de Estado?

Essas perguntas não encontram resposta no texto, e nem mesmo nos tadicionais e modernos manuais de teoria do estado e direito constitucional, mas creio que esteja intimamente ligadas às questões de relativização da soberania dos Estados nacionais, adoção do direito comunitário e prevalência dos tratados sobre os ordenamentos internos ou mesmo à teoria intercultural da Constituição, como trata o Prof. Bruno Galindo em sua tese de doutorado.

Porém, em que pese a importância da decisão tomada pelo STF no RE 466.343/SP, histórica, de fato, considerando a expressa previsão do constituinte de 1988 pela possibilidade de prisão do depositário infiel, é de se questionar se ela realmente instaura uma "nova era" ou um novo Estado, e se a configuração deste exige, como faz parecer o texto, uma verdadeira "caça às bruxas" aos juízes ditos legalistas/positivistas.

Como se sabe, a lei ocupa cada vez menos espaço de influência na formação da convicção do julgador desde o acolhimento da jurisprudência de valores e sobreposição da normatividade dos princípios nos ordenamentos jurídicos ocidentais, tanto que alguns chegam a afirmar, como se fosse possível medir com um sismógrafo, que a lei hoje é apenas 8% da decisão judicial, constistindo os demais 92% na pré-compreensão do julgador, da qual integram as crenças pessoais, sentimentos, emoções, pragmatismo, dentre outras razões.

Nessa quadra dos acontecimentos, e quando pesquisas e mais pesquisas sócio-jurídicas apontam que o binômio jurisdição constitucional/direitos fundamentais não encerra em si mesmo a solução para todos os nossos problemas, e pior, às vezes criam outros, soa precipitado decretar morte, sob o tom de grito de guerra, aos juízes legalistas/positivistas que por apego à lei (no sentido kelseniano) adquiriram a alcunha de jurássicos ou dinossáuricos.

Não sou pessimista ou cético quanto às inúmeras possibilidades de êxito da justiça constitucional em relação à garantia e eficácia dos direitos humanos nos planos nacional e internacional, mas cair no oba-oba de decretar a vigência de um novo modelo de Estado a partir de uma decisão do STF, repito, histórica e marcante na proteção das liberdades individuais, parece ser um tanto precipitado, e porque não dizer também equivocado.

26 de novembro de 2008

Enfim um bom show! Alanis em Recife

Algo a se comemorar, caso se confirme, considerando que o Recife não está inserido nas grandes turnês que vêm ao Brasil.

Alanis Morissette fará show no Recife
Canadense se apresentará no Chevrolet Hall


Do JC OnLine
Recife está inserida na turnê mundial do álbum "Flavors of Entanglement", da canadense Alanis Morissette. O show será dia 30 de janeiro, no Chevrolet Hall. É a primeira vez que a cantora virá ao Estado. A informação foi confirmada na tarde desta quarta-feira (26) pela assessoria de imprensa da casa de shows, que não adiantou mais detalhes.

O novo disco autoral de Alanis chegou às lojas em julho passado e, conforme anunciado na época, tem repertório fruto de uma catarse emocional da artista, após desenlace afetivo com o ator Ryan Reynolds.

24 de novembro de 2008

Gilmar Mendes, o STF e o Guardião da Constitição: o debate Kelsen x Schmitt permanece bem atual.


A QUEM CABE A DEFESA DA CONSTITUIÇÃO?

As discussões sobre em que instância de decisão político-jurídica, chefia do Estado ou Tribunal Constitucional, deve se dar a preservação das normas Constitucionais e a unidade do Estado de Direito para melhor servir aos propósitos da democracia parecem mais atuais que nunca no Brasil.

Acabo de ler a entrevista concedida por Gilmar Mendes à imprensa após o término do 6º encontro de Cortes Supremas do Mercosul (http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=99519) que, fazendo o papel do bom "anfitrião" que mantém a "casa bem arrumada" para os visitantes, ressalta as qualidades do papel recente desempenhado pelo STF no exercício da jurisidição constitucional das liberdades fundamentais dos cidadãos brasileiros e dos "bons préstimos" que a Corte tem oferecido ao país.


Embora coerência não seja lá uma das suas grandes virtudes, a julgar pelas últimas ocorrências e declarações sobre alguns julgamentos da Corte (e não precisa pensar muito pra saber quais são), o discurso do presidente do STF parece bem semelhante com o texto de sua autoria prefaciando a obra "O Guardião da Constituição", publicada pela Editora Del Rey em 2006, onde Gilmar posiciona-se ao lado da tese defendida por Kelsen, ou seja, de que é o Tribunal Constitucional o foro adequado para a defesa do texto constitucional (sobre o tema vale a pena ler uma matéria publicada no caderno Mais do jornal Valor Econômico em 21/11/08 intitulada A inspiração para Gilmar Mendes, que fala sobre a influência dos seus estudos na Alemanha e da doutrina de Peter Häberle nas convicções do Ministro.
Bom, mas enquanto para Schmitt, filósofo e jurista alemão, filiado ao partido nazista em 1933, e considerado por alguns como "o juiz de Hittler" apresentava a idéia de que caberia ao Presidente do Reich, por questão de legitimidade, a guarda da Constituição (ressalte-se que sua tese foi concebida antes da sua filização partidária e ainda sob a égideda Constituição de Weimar de 1919 - de feição liberal e burguesa, mas com vários direitos sociais encartados); para Kelsen tal concentração de poder nas mãos do chefe do executivo não seria salutar para um regime democrático, apostando mais no entedimento "técnico" de um órgão semelhante ao de um tribunal judiciário, mas que estivesse fora da estrurura de qualquer dos poderes.
Por vezes parece que Kelsen foi vencedor desse debate, em outros casos é possível atribuir razão à Schmitt, coisas da dialética inerente à própria democracia e a política de modo geral, mas o que chama a atenção é como essa dicotomia parece atual nas discussões sobre o atual papel do STF e da própria jurisdição constitucional, razão pela qual a leitura das obras é tão importante para compreender esse fenômeno.
Vejam nos seguintes trechos como o entrevistado Gilmar responde a três questionamentos que envolvem/envolverão a Corte:
Medida Provisória (decisão do presidente do Senado sobre MP das entidades filantrópicas)

Gilmar Mendes - Os senhores vão me poupar de responder a isso, até porque pode haver uma judicialização contra esse ato do presidente do Senado. Os senhores sabem que há uma crise desse modelo de medida provisória, eu tenho falado sobre isso e até tenho apontado a exaustão desse modelo. Eu falo com toda a sinceridade, fui assessor de governo, advogado-geral da União, de certa forma era um pouco apontado por aí como o responsável pela edição de todas as medidas provisórias. Trabalhei no modelo da Emenda [Constitucional] 32, esse que reviu o modelo das medidas provisórias. Na época, me lembro que falei com o [então] senador José Fogaça, que batia muito nessa fórmula do trancamento de pauta. Eu dizia, se nós continuarmos com esse modelo, de um número excessivo de Medidas Provisórias combinado com trancamento de pautas – até essa imagem os senhores já usaram na mídia –, nós vamos ter um tipo de roleta russa com todas as balas no revólver. Você pára o Congresso toda hora. E é o que está acontecendo. Tanto é que o Congresso, agora, diz que só decide dentro daquelas janelas deixadas pelas MPs. Portanto, ele foi expropriado do seu direito de agenda. É isso que aconteceu. E por isso o Congresso começa a buscar alternativas. Se essa alternativa é correta ou se não é, isto o tempo dirá.

Nova proposta de indiciamento de Daniel Dantas confronta com os dois habeas corpus concedidos pelo STF?

Gilmar Mendes - O Habeas Corpus aqui só discutiu prisão provisória e prisão preventiva. Investigação, denúncia, isso é coisa da primeira instância mesmo. Aqui só se discutiu se havia pressupostos ou não para a prisão provisória. Há um erro muito elementar que até experts fazem – vocês fazem também – mas os experts em geral, às vezes os procuradores, de confundir os pressupostos da prisão preventiva, da prisão provisória, da prisão cautelar em geral, com os pressupostos para oferecimento da denúncia. Significa dizer, se há ou não a prática em tese do delito. Se há ou não a prática do delito, isso justifica o oferecimento da denúncia. Agora, se a pessoa pode fugir, se pode de fato evadir-se, se pode consumir provas, etc, podem estar ou não presentes os pressupostos da prisão provisória. São coisas totalmente diferentes. Vejam se vocês ajudam os procuradores, inclusive, a entenderem isso.
Julgamento de Paulo Medina – já foram dois dias de julgamento, mas ainda não se entrou efetivamente no mérito, só nas preliminares, na defesa. Existe um excesso de cautela nesse caso, por ele ser ministro do STJ?

Gilmar Mendes - Não. É assim que o Tribunal trata processo penal. Se os senhores olharem os habeas corpus que são discutidos aqui, [vão perceber] o cuidado que nós temos ao tratar desses processos. Os senhores tiveram oportunidade de acompanhar o julgamento. O STF tem uma importância muito grande porque ele decide o caso, principalmente em uma matéria como essa, de direitos fundamentais, mas a sua decisão se projeta para além do caso. As pessoas começam a citar frações da ementa, pedaços da ementa, para dizer que o Tribunal decidiu desta ou daquela maneira. Por isso que nós temos que ter muito cuidado. Formulamos nossos votos e fazemos aquilo que na linguagem técnica se chama “obter dictum”, coisa dita de passagem, para deixar claro o que nós pensamos sobre isso, para não fazermos autorizações indevidas, que depois podem dar ensejo a práticas arbitrárias. E eu até disse ontem uma coisa, sobre a qual venho refletindo: um Tribunal como este é muito importante pelo que ele faz, em termos de realização de direitos. Mas ele é muito mais importante pelo que ele evita que se faça. Significa dizer: pelo tipo de pedagogia que ele introduz, e evita que agentes policiais, procuradores, juízes e delegados perpetrem arbitrariedades. Por isso que nós temos que ter cuidado quando temos um julgamento como esse.
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Nas três respostas, sem maior aprofundamento, é possível identificar o seguinte: O Executivo é o grande responsável pela atrofia do sistema legislativo do país (ou seja, não pode o chefe do Executivo acumular mais poder dos que já estabelecidos na CF, mas o STF sim, já que a CF é o que ele diz que é - não é?); o MP e o Judiciário de 1ª instância no caso Dantas andaram cegos, doentes, já que esqueceram conceitos elementares de processo penal (precisamos de um ente maior, fora dessa estrutura, com superpoderes para dizer o que é melhor-sempre); o STF e suas inovadoras técnicas de decisão (que de novas não têm lá muita coisa e estão sendo revistas com muitas restrições na sua matriz-Alemanha) é que tem oferecido as respostas adequadas e satisfatórias aos brasileiros, fator que contribui com a nossa democracia.
Coincidência com a concepção de Kelsen?
Que modelo está certo ou errado? É possível definir que há aqui uma resposta juridicamente adequada (na forma da moldura kelseniana) para resolver os nossos problemas?
Acho que estamos precisando revisitar a obra de Carl Schmitt, ainda que seja só para criticar o que está posto, afinal, a quem serve a conveniência do consenso?

12 de novembro de 2008

A boa de hoje!

Dica de um programa legal pra ouvir e discutir temas ligados aos direitos humanos. Se você tem um tempo disponível entre hoje e sexta não deixe de participar.

Programação em: http://www.cresspe.org.br/noticia.php?nid=35

Seminário na UFPE discute ética, democracia e direitos humanos

Em comemoração aos 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, os 20 anos da Constituição Federal, os 15 anos do Código de Ética do Serviço Social e os 10 anos da Comissão de Direitos Humanos da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), começa nesta quarta-feira (12) o seminário Ética, Democracia e Direitos Humanos: Crítica Histórica e Transformação do Real. Além da celebração, pretende-se debater o que foi prometido no âmbito legal e o que é cumprido na prática. As palestras acontecerão no auditório do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (CSSA) da UFPE até a sexta-feira (14).

Durante os três dias do evento, que é promovido pelo Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da UFPE, serão discutidos temas como a atualidade da Declaração Universal dos Direitos Humanos, os crimes de tortura cometidos durante a ditadura militar, movimentos sociais e a luta pelos direitos humanos em Pernambuco, os avanços e desafios da Constituição Federal de 1988 e as formas de enfrentamento à violação dos direitos humanos.

No total, serão sete mesas com 13 palestrantes, além de um debate com líderes dos movimentos de luta pelos direitos humanos em Pernambuco. Também haverá exposição fotográfica, lançamento de livros, exibição de filme, peça teatral e recital de poesia.

Entre os participantes estão o procurador da República Marlon Weichert, autor da ação contra o Coronel Brilhante Ustra, símbolo da violência da ditadura militar no Brasil, além da coordenadora da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, Suzana Lisboa, do cientista político Michel Zaidan e do coordenador de formação do Movimento Nacional dos Direitos Humanos, Paulo César Carbonari.

7 de novembro de 2008

Ainda os ecos da Satiagraha...


O migalhas de hoje traz considerações e uma crítica ao julgamento do HC cuja ordem foi concedida ontem pelo STF.

Reproduzo:


Quantas, Dantas ?
Por 9 a 1, o STF considerou legal a decisão de libertar Dantas. Em tom áspero, Peluso colocou em xeque certos atos do magistrado paulista. Outros pares seguiram nesta mesma linha, achando que o juiz "desrespeitou" a decisão do STF. Já o ministro Marco Aurélio Mello, que talvez seja dos ministros o mais festejado pela advocacia, sobretudo a criminal, por suas posições liberais, foi contra o HC. Para ele, houve, sim, supressão de instâncias. Com sua lógica sempre bem delineada, ele acompanhou todos os passos dos Habeas. O primeiro, preventivo, que deu origem ao segundo, liberatório da provisória. E o terceiro, o saltitante, referente à preventiva. Saiba mais lendo: http://www.migalhas.com.br/mostra_noticia.aspx?cod=73147

Nota de nascimento
Pesando alguns quilinhos, robusto e corado, acaba de nascer na Capital Federal o princípio da fungibilidade do habeas corpus. Mãe e filho passam bem.

Não saia de casa sem ele
Na dúvida, tenha sempre em mãos um HC distribuído no Supremo. Você nunca sabe quando precisará.


4 de novembro de 2008

Obama ou McCain?

As eleições norte-americanas têm tomado um espaço gigante na impresa do mundo inteiro, o que já era de se esperar nas CNTP´s, imagina então em um momento de crise como esse...

Via de regra, não gosto de embarcar na "onda do momento", mas considerando o teor de "instigação" que o tema provoca, vão aqui algumas considerações.

Primeiro, que sistema eleitoral mais vagabundo esse dos americanos viu, a bem da verdade parece que eles pretendem criam uma antipatia em votar, apenas pra citar algumas das incongruências que se verificam, vejamos: urnas arcaicas com mais de 50 anos e erros no cômputo dos votos dos eleitores (convites ao erro e a fraude), justo no país da Microsoft; filas gigantescas onde os cidadãos devem permanecer por até 8 ou 10 horas sob sol e chuva, no país dos fast foods e drive thrus; sistema de eleição indireta com a indicação de delegados pra eleger um candidato pra cargo majoritário, contrariando o princípio do "one man one vote" de feição democrática, justamente onde o "do yourself" faz parte do cotidiano das pessoas, são algumas das mazelas descritas a título de exemplo.

Mas para não ficarmos apenas por aí, porque isso que foi dito a grande imprensa já traz em todos os jornais; tvs; revistas; etc... (se brincar até a Luciana Gimenez, a Galisteu, a Hebe e o Leão Lobo estão noticiando e comentando as eleições com aquele ar de pessoas "bem informadas"), poderíamos falar um pouco dos altíssimos índices de alienação eleitoral dos americanos (quem dera fosse só deles) ou das distinções verificadas no registro de eleitores brancos e negros e nas dificuldades destes em ter seu voto reconhecido e validado nos postos de votação (ver o ensaio do Luis Weis em http://www.observatoriodaimprensa.com.br/blogs.asp?id_blog=3&id={618868DE-6883-43D8-960C-F93DFB2EA3E9

Mas também não vou falar disso, gosto de política, mas não sou cientista político, não vou meter o bedelho onde não fui chamado, além disso não conheço dados estatísticos sobre o tema, como disse, a imprensa brasileira não noticia essas coisas, e creio que a americana noticia com certa dose de maquiagem.

Vou opinar então sobre o que deve ser o fator decisivo das eleições, falar sobre as impressões que tenho dos candidatos e, fingindo que tenho direito a voto nos states, dizer em quem voto e por que razões. (Vou dividir isso em outros posts)

Se há uma coisa que posso afirmar com certeza é que o fator decisivo das eleições será a economia, meu caro, estamos a caminho do pior momento econômico do planeta desde 1929, digo a caminho porque os efeitos da crise financeira ainda não atingiram com toda força na economia real, a recessão ainda não mostrou sua profundidade, o que deve acontecer a partir do segundo semestre do ano que vem.

NÃO SE ENGANE - O eleitor americano, seja o branco operário e com ensino médio, o negro bacharel e autônomo, a senhora aposentada que tem nos fundos de pensão o trabalho de uma vida inteira, o latino que busca melhoria de sua condição ocupando um subemprego ou nas ruas das grandes cidades, quer saber mesmo é de segurança no emprego, aumento dos lucros, investimento rentável e oportunidades de faturar - e nessa hora fala mais alto quem apresenta melhores condições de mudar o rumo dos acontecimentos, seja ele branco, preto, amarelo, azul, elefante cor de rosa, o escambal, digo mais, se existisse algum cara verde eu apostaria nele, afinal, qual a cor do dólar $$$$???

Outubro/2008: que mês terrível hein, ou não!

Em que pese o baixo número de visitas no blog, explico que a falta de posts no mês de outubro teve como causas as seguintes:

1) Perdi muito tempo acompanhando o Sport, que após a derrota no último minuto do 2º tempo com um gol do Atlético/PR, consegue a proeza do 8º jogo sem vencer. PQP o que houve com a garra do campeão do Brasil???
2) Voltei a ter uma atividade física regular, showw de bola, ainda que seja apenas um cooper na beira rio;
3) Tive de revisar meu projeto de dissertação de mestrado, vamos ver se o pessoal da FDR agora me deixa estudar;
4) Fui a algumas baladinhas noturnas na nossa querida Hellcife, e isso fazia tempo viu, bom, sempre é tempo de curtir né :P

Fora isso, como diz a descrição do blog, sempre um pouco mais do mesmo...

E pra manter a falta de originalidade, "invente, tente, vamos fazer um novembro/08 diferente" - férias à vistaaa! - pena que o dólar pipocou :(

8 de outubro de 2008

Cohecimento acadêmico + influência política = uma combinação explosiva?



Fiquei bastante surpreso ao ler a matéria publicada na revista Carta Capital, disponível no portal Terra http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI3236365-EI6578,00-Mendes+critica+CartaCapital+Mino+Carta+rebate.html sobre a concessão de financiamentos bancários para ampliação dos negócios promovidos pelo Instituto Brasiliense de Direito Público/IDP, cujos sócios são o Ministro Gilmar Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco.

Registro que não foi o motivo de minha surpresa o fato de vários ministros do STF e do STJ lecionarem nos cursos da referida instituição, ou mesmo o crescimento do sucesso do IDP no DF, considerando a qualidade dos cursos ministrados, sua organização, corpo docente, etc... o que já seria esperado em razão do preparo dos professores e o alto valor das mensalidades. Mas o que causa espanto, realmente, é o relato de que os sócios teriam conseguido dar um "jeitinho" para driblar regras na concessão de financiamento bancário e enquadramento no Programa de Promoção do Desenvolvimento Econômico Integrado e Sustentável (Pró-DF II), do governo Joaquim Roriz (PMDB), para adquirir um terreno no plano piloto, local da nova sede do IDP, com nada mais nada menos de que 80% off.

Confesso que boa parte da minha surpresa/decepção se deu pelo fato de ter cursado minha especialização em direito público no IDP, com orientação do Prof. Inocêncio Coelho, cujas lições de Hermenêutica Constitucional, a forma sóbria de passar seus ensinamentos de filosofia do direito e ética geraram em mim grande admiração e apreço.

Também nunca escondi que sou um admirador do Ministro Gilmar Mendes, não pelo seu desempenho na Corte, mas pelas lições doutrinárias, preparo intelectual e perspicácia de raciocínio que ficavam evidentes nas aulas de controle de constitucionalidade, além das ótimas respostas às provocações feitas por nós alunos, algumas insistentes como as minhas e as do meu amigo Gerson Pereira.

Com relação ao fato de que o IDP celebrou diversos contratos sob inexigibilidade de licitação com diversos órgãos da União (Aeronáutica; Senado;CGU; PGFN; etc...) creio que seja matéria a ser apurada nas instâcias próprias, auditorias internas e o TCU, pois evidências e conjecturas devem ser antes de tudo verificadas, mas que já se levantam suspeitas não há dúvidas.

Não há dúvidas também que a matéria e o levantamento dos dados guardam relação, eu diria até motivação, no episódio Daniel Dantas/PF/Operação Satiagraha/HCs concedidos pelo Gilmar, mas que os fatos estão a merecer esclarecimento estão. Como escrito dia desses em outro post: Qual será o próximo capítulo???

29 de setembro de 2008

Cenas do próximo capítulo: a retaliação.

No migalhas de hoje, mais uma:

Satiagraha
Juízes federais de todo o país estudam forma de protesto contra a iniciativa do presidente do STF, Gilmar Mendes, de mandar a corregedoria investigar suposto abuso de autoridade cometido pelo juiz Fausto De Sanctis, que decretou prisão de Daniel Dantas 24 horas após o ministro ter concedido HC ao banqueiro.

26 de setembro de 2008

Qual será o próximo capítulo dessa novela?









O informativo Migalhas (http://www.migalhas.com.br/), não obstante assemelhar-se as vezes a um jornal associativo de escritórios da advocacia paulistana, não o deixando de ser, traz com certa frequência observações interessantes sobre a tão falada "crise institucional na relação entre os poderes da República", termo usado pelo Min. Gilmar Mendes para definir a suspeita de que seu gabinete teria sido monitorado durante a operação Satiagraha da PF, cujo "alvo" Daniel Dantas conseguiu a façanha de ter dois habeas corpus examinados pela Presidência do STF em menos de 48 horas, sem ter de percorrer a incômoda via tortuosa (TRF-STJ-STF), em razão de um malabarismo interpretativo que afastou a iterativa jurisprudência da Egrégia Suprema Corte e provocou a reação de juízes e procuradores em todo o Brasil.

Pois é, a edição de hoje do informativo nos dá conta de que o "alvo" ou agora "alvos" realmente mudaram, e, após as insistentes disparadas da CPI dos Grampos contra o delegado da PF Protógenes Queiroz (http://blogdoprotogenes.com.br/), chegou a hora do juiz Fausto de Sanctis ir pra berlinda para que possa esclarecer os termos de sua decisão, ato jurisdicional insidicável fora dos limites do ordenamento jurídico pelo Poder Judiciário.

Construção da história: O jornal Folha de S.Paulo afirma que, a pedido de Gilmar Mendes, o juiz Fausto De Sanctis foi intimado anteontem pela Corregedoria do TRF a se explicar sobre o motivo que o levou a decretar a prisão do banqueiro Daniel Dantas. Se for verdadeiro o pedido, o mundo virou de ponta cabeça. Antigamente, pelo menos era assim, a decisão era fundamentada. E não cabia a outro juiz pedir embargos de declaração. Se a lei mudou, favor deixar na portaria de nosso suntuoso edifício sede o novo livrinho de regras, para que possamos ter ciência. E durma-se com um barulho desses.

"É constrangedor"... ... foi o que disse De Sanctis, ontem, às 10h, ao depor no inquérito policial 964/08, que investiga suposto grampo contra o ministro Gilmar Mendes. Durante três horas e dez minutos, foi ouvido pelo delegado Willian Marcel Murad, da PF. Uma procuradora acompanhou a audiência. O magistrado negou ter ordenado ou mesmo concordado com a interceptação de "pessoas com prerrogativa de foro". Também negou ter comentado com a desembargadora Suzana Camargo que Gilmar Mendes estivesse sob monitoramento.

22 de setembro de 2008

É na crise que a gente se diverte.

Esse post é a reprodução de um cômico e-mail que recebi sobre o tema do momento.
Tradução da crise do subprime:


1) O seu Biú tem um bar, na Vila Carrapato, e decide que vai vender cachaça "na caderneta" aos seus leais fregueses, todos bêbados, quase todos desempregados;

2) Porque decide vender a crédito, ele pode aumentar um pouquinho o preço da dose da branquinha (a diferença é o sobrepreço que os pinguços pagam pelo crédito...);

3) O gerente do banco do seu Biú, um ousado administrador formado em curso de emibiêi, decide que as cadernetas das dívidas do bar constituem, afinal, um ativo recebível, e começa a adiantar dinheiro ao estabelecimento tendo o pindura dos pinguços como garantia;

4) Uns seis "zécutivos" de bancos, mais adiante, lastreiam os tais recebíveis do banco, e os transformam em CDB, CDO, CCD, UTI, OVNI, SOS ou qualquer outro acrônimo financeiro que ninguém sabe exatamente o que quer dizer. Esses investimentos são avalizados por consultorias, cujos principais clientes são os próprios bancos...

5) Esses adicionais instrumentos financeiros alavancam o mercado de capitais e conduzem a operações estruturadas de derivativos, na BM&F, cujo lastro inicial todo mundo desconhece (as tais cadernetas do seu Biú...), mas compra avidamente;

6) Esses derivativos estão sendo negociados como se fossem títulos sérios, com fortes garantias reais, nos mercados de 73 países!

7) Até que alguém descobre que os bebuns da Vila Carrapato não têm dinheiro para pagar as contas, e o Bar do seu Biú vai à falência. E toda a cadeia sifu!

Nesse Zoo que animal você seria?

Li hoje interessante artigo assinado pelo Alberto Dines, disponível em http://www.observatoriodaimpresa.com.br/ sobre o comportamento da mídia na cobertura da crise hipotecária norte-americana e suas devastadoras consequências no sistema financeiro.

O JC de hoje publicou artigo semelhante, também do Dines, intitulado "A hora do chimpanzé".

O articulista expõe sua visão crítica de como algumas notícias parecem refletir o papel da imprensa como agente intermediador de interesses de corporações financeiras quando está em jogo o ímpeto do investidor em adotar posturas de "urso" = conservador ou "touro" = agressivo, agraciando o público (leia-se a massa de pequenos investidores menos avisados) com o suposto discurso otimista representado pelo jargão de que "o pior já passou".

Segue a íntegra do artigo:

CRISE FINANCEIRA GLOBAL

A mídia, o touro e o urso
Por Alberto Dines em 22/9/2008


O comportamento da nossa mídia na sexta-feira (19/9) serviu para mostrar o papel dos meios de comunicação na fabricação das bolhas. Depois da devastação iniciada seis dias antes, como se nada tivesse acontecido, um conjunto de decisões paliativas dos principais bancos centrais, inclusive o nosso, elevaram as cotações das bolsas a níveis extraordinários.
A disparada felizmente aconteceu na véspera do último fim de semana que, desta vez, funcionou como um moderador de delírios. Ficou evidente que a rearrumação do sistema financeiro foi pontual, pode até manter-se nos próximos dias, mas será incapaz de reconstruir – ou pelo menos maquiar – os tremendos danos causados ao sistema financeiro internacional pela crise hipotecária americana.
Os mercados estão mais sensíveis aos efeitos danosos das euforias anteriores, não só admitem mas imploram mais regulação e mais fiscalização. A mídia, porém, terá que aprender a viver com os pés na realidade, precisará vacinar-se contra as ilusões de prosperidade instantânea e contra a exaltação produzida por interesses corporativos nem sempre legítimos. Doravante uma das missões dos meios de comunicação será a de furar bolhas. Mesmo que isto desagrade aos anunciantes do mercado financeiro.
Para continuar como defensora do interesse público, a imprensa deverá municiar-se de um estoque de baldes de água para esfriar a cabeça dos delirantes. Se aderir à irresponsabilidade, pode até ganhar alguns bônus, mas ficará com o ônus do apocalipse.
Valores particulares
A imprensa periódica surgiu e se desenvolveu há cerca de 400 anos graças à sua capacidade de funcionar como fiscal e como alarme. Tornou-se indispensável porque é confiável, é confiável porque consegue (ou conseguia) ser razoavelmente autônoma dentro do Estado de Direito.
Ao assumir o papel de irrestrita aliciadora de entusiasmos, a imprensa abdica do seu papel crítico. No caso dos surtos do mercado financeiro, a imprensa não pode favorecer a exuberância irracional, mesmo sob o pretexto "social" de distribuir otimismo ao seu público.
A bolsa de Nova York opera sob a égide de dois totens: o urso molenga, cauteloso e o touro bravio, símbolo do empenho e do otimismo, valorizado com uma estátua. Esta é uma polarização calcada em valores particulares. A mídia não tem obrigação de venerar o touro tal como fazem os operadores do mercado financeiro. A mídia deve saber que em suas loucas arremetidas o touro nada enxerga.

18 de setembro de 2008

Você reformaria essa sentença?

Recebi uma sentença judicial outro dia de uma colega professora e achei que ilustra um feliz exemplo de como podemos enxergar o "otherside" das coisas na interpretação e aplicação do direito. Nada de ode ao direito achado na rua como se propagou durante o boom do direito alternativo na década de 90, mas um esforço de aproximar direito e realidade social de modo inclusivo.

Segue a íntegra do interessante mail:

O juiz Gerivaldo Alves Neiva, de Conceição do Coité, município baiano de 60 mil habitantes, deparou-se ontem com um dilema ao julgar determinado processo.
Um mudinho, conhecido por perambular na cidade e esporadicamente cometer pequenos delitos, foi preso por tentativa de furto de uma loja. Como já fora condenado por outro crime, não era possível a suspensão condicional do processo.

O juiz decidiu condená-lo em pena alternativa (a ser cumprida juntamente com a mãe do condenado e com um oficial de justiça), consistente em entregar uma cópia da sentença em cada órgão público, associação, igreja e jornal da cidade. Recomendou ainda que ele aproveitasse para pedir emprego e escola. E finalizou a sentença com um conselho: "não roubes mais!".

Processo Número 1863657-4/2008
Autor: Ministério Público Estadual
Réu: B.S.S
B.S.S é surdo e mudo, tem 21 anos e é conhecido em Coité como "Mudinho."
Quando criança, entrava nas casas alheias para merendar, jogar vídeo-game, para trocar de roupa, para trocar de tênis e, depois de algum tempo, também para levar algum dinheiro ou objeto. Conseguia abrir facilmente qualquer porta, janela, grade, fechadura ou cadeado. Domou os cães mais ferozes, tornando-se amigo deles. Abria também a porta de carros e dormia candidamente em seus bancos. Era motivo de admiração, espanto e medo!
O Ministério Público ofereceu dezenas de Representações contra o então adolescente B.S.S. pela prática de "atos infracionais" dos mais diversos. O Promotor de Justiça, Dr. José Vicente, quase o adotou e até o levou para brincar com seus filhos, dando-lhe carinho e afeto, mas não teve condições de cuidar do "Mudinho."
O Judiciário o encaminhou para todos os órgãos e instituições possíveis, ameaçou prender Diretoras de Escolas que não o aceitava, mas também não teve condições de cuidar do "Mudinho."
A comunidade não fez nada por ele.
O Município não fez nada por ele.
O Estado Brasileiro não fez nada por ele.
Hoje, B.S.S tem 21 anos, é maior de idade, e pratica crimes contra o patrimônio dos membros de uma comunidade que não cuidou dele.
Foi condenado, na vizinha Comarca de Valente, como "incurso nas sanções do art. 155, caput, por duas vezes, art. 155, § 4º, inciso IV, por duas vezes e no art. 155, § 4º, inciso IV c/c art. 14, inciso II", a pena de dois anos e quatro meses de reclusão.
Por falta de estabelecimento adequado, cumpria pena em regime aberto nesta cidade de Coité.
Aqui, sem escolaridade, sem profissão, sem apoio da comunidade, sem família presente, sozinho, às três e meia da manhã, entrou em uma marmoraria e foi preso em flagrante. Por que uma marmoraria?
Foi, então, denunciado pelo Ministério Público pela prática do crime previsto no artigo 155, § 4º, incisos II e IV, c/c o artigo 14, II, do Código Penal, ou seja, crime de furto qualificado, cuja pena é de dois a oito anos de reclusão.
Foi um crime tentado. Não levou nada.
Por intermédio de sua mãe, foi interrogado e disse que "toma remédio controlado e bebeu cachaça oferecida por amigos; que ficou completamente desnorteado e então pulou o muro e entrou no estabelecimento da vítima quando foi surpreendido e preso pela polícia."
Em alegações finais, a ilustre Promotora de Justiça requereu sua condenação "pela pratica do crime de furto qualificado pela escalada."
B.S.S. tem péssimos antecedentes e não é mais primário. Sua ficha, contando os casos da adolescência, tem mais de metro.
O que deve fazer um magistrado neste caso? Aplicar a Lei simplesmente? Condenar B.S.S. à pena máxima em regime fechado?
O futuro de B.S.S. estava escrito. Se não fosse morto por um "proprietário" ou pela polícia, seria bandido. Todos sabiam e comentavam isso na cidade.
Hoje, o Ministério Público quer sua prisão e a cidade espera por isso. Ninguém quer o "Mudinho" solto por aí. Deve ser preso. Precisa ser retirado do seio da sociedade. Levado para a lixeira humana que é a penitenciária. Lá é seu lugar. Infelizmente, a Lei é dura, mas é a Lei!
O Juiz, de sua vez, deve ser a "boca da Lei."
Será? O Juiz não faz parte de sua comunidade? Não pensa? Não é um ser humano?
De outro lado, será que o Direito é somente a Lei? E a Justiça, o que será?
Poderíamos, como já fizeram tantos outros, escrever mais de um livro sobre esses temas.
Nesse momento, no entanto, temos que resolver o caso concreto de B.S.S. O que fazer com ele?
Nenhuma sã consciência pode afirmar que a solução para B.S.S seja a penitenciária. Sendo como ela é, a penitenciária vai oferecer a B.S.S. tudo o que lhe foi negado na vida: escola, acompanhamento especial, afeto e compreensão? Não. Com certeza, não!
É o Juiz entre a cruz e a espada. De um lado, a consciência, a fé cristã, a compreensão do mundo, a utopia da Justiça… Do outro lado, a Lei.
Neste caso, prefiro a Justiça à Lei.
Assim, B.S.S., apesar da Lei, não vou lhe mandar para a Penitenciária.Também não vou lhe absolver.
Vou lhe mandar prestar um serviço à comunidade.Vou mandar que você, pessoalmente, em companhia de Oficial de Justiça desse Juízo e de sua mãe, entregue uma cópia dessa decisão, colhendo o "recebido", a todos os órgãos públicos dessa cidade – Prefeitura, Câmara e Secretarias Municipais; a todas as associações civis dessa cidade – ONGs, clubes, sindicatos, CDL e maçonaria; a todas as Igrejas dessa cidade, de todas as confissões; ao Delegado de Polícia, ao Comandante da Polícia Militar e ao Presidente do Conselho de Segurança; a todos os órgãos de imprensa dessa cidade e a quem mais você quiser.
Aproveite e peça a eles um emprego, uma vaga na escola para adultos e um acompanhamento especial. Depois, apresente ao Juiz a comprovação do cumprimento de sua pena e não roubes mais!
Expeça-se o Alvará de Soltura.
Conceição do Coité- Ba, 07 de agosto de 2008, ano vinte da Constituição Federal de 1988.
Bel. Gerivaldo Alves NeivaJuiz de Direito

Quando não são as gêmeas que caem são os Brothers: um pouco da crise.

Nunca gostei de ler jornalistas, escritores ou cientistas que escrevem sobre o Brasil como se tivessem nascido e crescido na Champs Elysée ou na 5ª Avenida em NY, desprezando o conhecimento e cultura populares para afirmar que toda a desgraça e insucesso do país está na forma como o povo se comporta diante de situações de crise, da incapacidade de gerar soluções alternativas ao subdesenvolvimento, da falta de preparo para o exercício livre dos instrumentos democráticos, etc... Coisas que falam, por exemplo, alguns "intelectuais" como Diogo Mainardi na sua coluna em Veja e outros da grande imprensa.

Mas o que chama a atenção nos escritos de alguns desses pensadores é o discurso em defesa da liberdade, em todos os seus segmentos, como saída exitosa para largar décadas, senão séculos, de atraso e avançar rumo ao desenvolvimento de novas tecnologias capazes de tirar o povo da situação de miserabilidade com a prometida geração de oportunidades na educação, saúde, emprego e renda, como se existisse, de fato, uma fórmula infalível do sucesso e que esta, inevitavelmente, estaria ligada a uma receita econômica de resultados eficientes.

O que parece incoerente, no entanto, é a prática da tão difundida doutrina em tempos pós-modernos.

Verificar o que digo aqui torna-se mais fácil em momentos de crise como a vivenciada hoje, onde se experimenta o caos da depressão nas bolsas de valores de todo o mundo; crise de crédito dos principais bancos de investimento (ex. quebra do Lehman Brothers); desconfiança no sistema financeiro das nações mais ricas entre outras consequências das conhecidas crises cíclicas do capitalismo.

Ora, se o mercado se autoregula e apresenta soluções para os mais variados tipos de crise, porque o FED (Banco Central norte-americano) precisou desembolsar do dia pra noite 85 bilhões de dólares para socorrer a gigante de seguros AIG? Ou ainda porque o Banco Central Europeu em dois dias (15 e 16/09) injetou 170 bilhões de euros para conter a ausência de liquidez em bancos considerados "sólidos"?

De onde sairam os recursos necessários a suavizar a crise que leva tanto temor aos mercados? Não seria do vilão Sr. Estado, monstro voraz, arrecadador de tributos e distribuidor de renda para os preguiçosos e incapazes?

E agora? Onde estão os astutos e arautos defensores das políticas econômicas liberais que depositam sua crença no sistema e confiam grande parte de seu dinheiro em especulação acionária de curto prazo? Resposta: Provavelmente arrancando os cabelos ao verem muitas das ações em que investiram cair até 90% em uma semana - hehehehe. (O tom de piada vem pra descontrair, inclusive porque eu também aplico parte das minhas economias no mercado de renda variável e a queda vertiginosa das bolsas também tem me deixado preocupado - nesse caso, procuro fazer como mandou a ex-Ministra Marta Suplicy = relaxa e goza).

Bom, de tempos em tempos a história se repete, oportuno lembrar o velho "corsi e ricorsi" tratado por Giambattista Vico (http://pt.wikipedia.org/wiki/Giambattista_Vico), historiador, filósofo e jurista italiano que entendia a progressão da história segundo uma cadência ternária (ao ciclo da natureza humana sucedia-se o da natureza poética e a este o da natureza heróica). Teria ele razão? É possível estabelecer alguma relação do que acontece hoje como o que aconteceu em 1999 (crise dos tigres asiáticos) ou mesmo em 1929? E mais, em sendo assim, podemos esperar um planejamento econômico pós-crise liderado e com atuação prioritária do Sr. Estado?


Pra quem, como eu, investiu parte de sua suada grana na Bovepa no embalo do investment grade e das entusiamadas descobertas do pré-sal, por enquanto creio eu, sem qualquer aprofundamento no tema, que a melhor pedida seja esquecer o sobe e desce das bolsas e concentrar esforços no que realmente seja sólido para o nosso dia-a-dia, nessa toada aguardemos o próximo looping dessa montanha russa.

Caminhando e Cantando?

A razão de escolha do título do Blog vem da melodiosa música "Pra não dizer que não falei das flores", composição de 1968 que conquistou o segundo lugar do festival da TV Globo daquele ano de edição do AI-5, marcado pelo endurecimento da ditadura no Brasil.
Creio seja a música mais "conhecida" do Geraldo Vandré, cantor paraibano, radicado no Rio de Janeiro, onde se formou em Direito, e depois exilado no Chile, França, Argélia, Alemanha, Áustria, Grécia e Bulgária nos 4 anos que ficou fora do Brasil, período em que se consolidou como "mito" da resistência contra a ditadura militar.
Identifico-me com a letra pelos variados sentidos de interpretação sugeridos e, apesar e não ter vivido a tensão social de uma longa e violenta ditadura militar, cuja ciência tive apenas pelos manuais de História do Brasil da escola e por relatos de pessoas que a vivenciaram, suponho ser ainda hoje uma bela mensagem de clamor pela liberdade, encorajadora de atitudes transformadoras de indivíduos inseridos em uma democracia.
Pra não dizer que não falei da letra (e não falei mesmo- hehehe), posto-a:

"Caminhando e Cantando e seguindo a canção
Somos todos iguais braços dados ou não
Nas escolas, nas ruas, campos, construções
Caminhando e Cantando e seguindo a canção
Vem, vamos embora que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora não espera acontecer
Vem, vamos embora que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora não espera acontecer
Pelos campos a fome em grandes plantações
Pelas ruas marchando indecisos cordoes
Ainda fazem da flor seu mais forte refrão
E acreditam nas flores vencendo o canhão
Há soldados armados, amados ou não
Quase todos perdidos de armas na mão
Nos quarteis lhes ensinam uma antiga lição
De morrer pela pátria e viver sem razão
Nas escolas, nas ruas, campos, construções
Somos todos soldados armados ou não
Caminhando e cantando e seguindo a canção
Somos todos iguais braços dados ou não
Os amores na mente, as flores no chão
A certeza na frente, a historia na mão
Caminhando e cantando e seguindo a canção
Aprendendo e ensinando uma nova lição"

Parece tão atual. O que você acha?