Segue o referido resumo:
21/8/2009 - STJ. Epilético. Ataque em frente a igreja. Sessão de exorcismo. Submissão. Consentimento. Ausência. Agressão física. Dano moral. ConfiguraçãoO Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, do STJ, manteve a decisão que condenou uma igreja a indenizar, em 50 salários mínimos, um cidadão. Aposentado devido à epilepsia, o homem acusa a igreja de agredi-lo sob o pretexto de realizar um «exorcismo». No caso, ele afirmou que, ao passar mal na frente de um dos templos onde a igreja realiza seus cultos, foi submetido a uma sessão de exorcismo. Disse, ainda, que os «obreiros» da Igreja o teriam levado para o altar, onde acabou desmaiando e teve várias convulsões. O aposentado declarou, ainda, que após a sessão de exorcismo, foi conduzido ao banheiro e agredido a socos e pontapés. Além disso, os pastores teriam subtraído de seu bolso a quantia que havia retirado do caixa eletrônico antes de passar mal. Com fundamento na Súmula 7/STJ, a Turma manteve a decisão atacada. (Ag. 981.417)
O que impressiona no caso é como duas vertentes de um mesmo direito: a liberdade, parecem chocar-se frontalmente quando está em jogo um tema por demais complicado, o exercício do culto e a manifestação da fé.
Longe de fazer referências aos recentes escândalos denunciados contra a Igreja Universal do Reino de Deus por utilização indevida do dinheiro de doações e enriquecimento ilícito de vários dos "pastores" daquela entidade religiosa, venho aqui fazer algumas considerações sobre como a inexistência de uma "ética da tolerância" na convivência social pode ser a causa de tamanho desrespeito à liberdade do outro.
Não é novidade entre aqueles que moram nos centros urbanos brasileiros que com frequência, ouve-se reclamações e outras queixas sobre a forma de abordagem de alguns "missionários" evangélicos ou sobre o barulho que transtorna a vida da vizinhaça dos templos em que são celebrados os cultos (http://www.jusbrasil.com.br/noticias/1613277/justica-de-minas-determina-reducao-de-barulho-em-cultos-de-igreja-evangelica), e ainda como alguns fiéis tratam desrespeitosamente imagens e outros ícones de religiões distintas, o que também constitui forma de desrespeito.
Não se pretende aqui também realizar uma cruzada contra qualquer tipo de crença, fui criado como católico, deixei de frequentar a igreja há anos, simpetizo com a doutrina espírita, mas não posso me considerar como tal, na verdade acho que para fazer o bem não é necessário integrar nenhum estandarte religioso, mas reconheço o importante papel dessas instituições como instrumentos de controle social.
Merecedor de destaque no pictórico caso apreciado pelo STJ é o fato de que estão em discussão no Poder Judiciário duas faces da liberdade, uma que protege a liberdade de culto e manifestação de crença, independentemente de prévia autorização de autoridade pública, e outra o livre ir e vir, a imagem, opção religiosa, e, no caso examinado, a própria integridade física da pessoa.
A imposição de limites ao exercício de direitos é marca indelével de qualquer democarcia constitucional, e a laicidade do Estado impede a subvenção ou patrocínio de atividades religiosas de qualquer que seja a crença professada, condição herdada do republicanismo clássico (separação entre Estado e Igreja), e típico direito fundamental de primeira geração.
Então, como impedir a ocorrência de abusos? Como criar mecanismos de fiscalização da atividade religiosa? A questão não parece tão simples quanto parece.
Recentemente a França tem enfrentado um debate polêmico sobre a possibilidade de uso de burcas pelas muçulmanas, que já estava proibida nas escolas públicas do país. Para o presidente Nicolas Sarkozy: "A burca não é um símbolo religioso, é um sinal de submissão das mulheres. Não será bem-vinda em nosso território”, causando a reação da grande população muçulmana daquele país e de setores ligados à defesa dos direitos humanos.
Aqui no Brasil temos algo parecido. É a discussão sobre a possibilidade de retirada dos crucifixos dos prédios públicos sob o fundamento da laicidade do Estado. Há duas semanas foi veiculado no site da AGU notícia a respeito (http://www.agu.gov.br/sistemas/site/TemplateImagemTexto.aspx?idConteudo=92245&id_site=3)
Longe de uma solução conciliatória ao modelo do consenso, que em matéria de religião às vezes parece ser palavra fora do dicionário, é um dos típicos casos onde se verifica um défict de reconhecimento cultural do "outro", cuja explicação é tratada pela teoria do reconhecimento do filósofo alemão Axel Honneth.
Sobre tal questão, como será que o glorioso STF se manifestaria?
Quem viver verá!