8 de janeiro de 2013

Hannah Arendt entre arte e filosofia: a banalidade do ato de escrever bem.

Há algum tempo vem crescendo meu interesse na obra de Hannah Arendt. Depois de "A Condição Humana" e "Sobre a Revolução", duas geniais obras que já marcaram posição como clássicos da teoria política (a própria Arendt preferia esse termo ao invés de "filosofia política"), estou lendo "Entre o Passado e o Futuro", outra contribuição inestimável dessa brilhante judia alemã perseguida pelo nazismo, regime que depois lhe serviu de análise e reflexão para construção de suas principais teses sobre liberdade e autoritarismo.

Conhecida pela intransigente defesa do pluralismo na esfera pública como condição da autonomia dos indivíduos, que livremente se reconhecem e assim constituem a política, Hannah Arendt pode ser considerada como exemplo de pensadora sagaz, capaz de articular as dimensões fáticas e valorativas próprias da política de modo particularmente interessante ao resgatar criticamente categorias do pensamento clássico como "vita activa" e "vita contemplativa", para problematizá-las com a universalidade da moral no pensamento kantiano e o significado do trabalho e da cultura capitalista do mundo moderno, segundo a vertente posta por Marx.

E para mim o mais impressionante: conseguir fazê-lo de uma forma magistral do ponto de vista da escrita (uma verdadeira banalização do ato de escrever bem!). A aliança entre clareza e consistência nos textos de Arendt são convidativos ao aprofundamento dos temas mais sensíveis da filosofia política. Desde as condições do pensamento na modernidade até a crise da cultura, do ensino e das estruturas institucionais da organização política. A forma como é trabalhada a "transição" entre a tradição e a modernidade em "Entre o Passado e o Futuro" é de um tom esclarecedor tal que parece converter um tema tão complexo de filosofia da história em um relato instigante sobre os (des)caminhos do pensamento ocidental e seus reflexos na vida social.

Não bastasse a tenacidade de suas reflexões e o vigor do seu legado para o resgate da dignidade da política como autêntico meio de legitimação das escolhas sociais, colaborando para uma das mais relevantes críticas ao autoritarismo baseado numa burocracia pouco compreensiva de seu papel ou vazia de reflexividade acerca da consequência de seus atos para a vida dos indivíduos (a famosa "banalidade do mal"), de que se serviram os regimes totalitários, Hannah Arendt possui uma biografia belíssima, uma história de vida realmente fascinante e que agora está no cinema. O filme ainda não está disponível no Brasil, mas o trailler (abaixo) já dá uma pequena mostra de que vale muito a pena procurá-lo assim que possível.


Essa pode ser uma bela demonstração de que a junção de arte e filosofia no cinema é uma experiência muito enriquecedora e capaz de viabilizar, na forma de lazer, a difusão de um pensamento tão importante na história intelectual do século XX, como é o de Hannah Arendt.

A seguir, a sequência de quatro vídeos do documentário "Hannah Arendt - Pensar Apaixonadamente" (em francês, com legendas em espanhol) que contam a história dela, com vários trechos de entrevistas concedidas, assim como alguns detalhes de sua amizade com o filósofo Karl Jaspers, o caso amoroso com Heidegger, a perseguição e o exílio na França e depois nos Estados Unidos, além de outras passagens da vida dessa extraordinária representante da teoria política contemporânea.






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