5 de março de 2009

E a questão do aborto?

Em tempos de discussão sobre o aborto da garota de 09 anos grávida após sucessivas e violações por seu padastro, a decisão dos médicos em realizar o aborto e a excomunhão declarada pelo arcebispo de Olinda e Recife aos que participaram da interrupção da gestação, a polêmica discussão jusfilosófica entre direito natural e direito positivo, dita por muitas como superada, parece ganhar espaço na cobertura midiática do caso.

Sobre o tema do aborto, segue um artigo de Cáudio Fonteles, católico fervoroso, e ex-Procurador Geral da República, vejamos:

O Estado cínico

Cláudio Fonteles

A discussão sobre o aborto assume grande relevo porque necessariamente diz com o tipo de sociedade em que almejamos viver: a sociedade amorosa, fraterna, solidária ou a sociedade do egoísmo, do abandono, da violência. E, porque a discussão é assim posta, assim devendo ser, efetivamente, o Estado, como a sociedade politicamente organizada, tem que enfrentar a questão e não, cinicamente, reduzi-la à esfera de opção individual.

A mulher e o embrião, ou o feto, se já alcançado estágio posterior na gestação, que está em seu ventre, são as grandes vítimas do cinismo estatal.

A mulher porque ou por todos abandonada – seu homem, sua família, seus amigos – ou porque, e o que é pior por assim caracterizar um estado de coisas, teme venha a ser abandonada pelo homem, pela família, pelos amigos.

A mulher porque incentivada, e estimulada, pela propaganda oficial e privada a desfazer-se da vida, presente em seu ser, como se a vida fosse um estorvo, um empecilho, um obstáculo que deve ser eliminado em nome, hipocritamente do direito à liberdade de escolha.

Não há liberdade de escolha quando a escolha é matar o indefeso.

O embrião, ou o feto, porque vida em gestação, mas, repito, vida-presente não se lhes permite a interação amorosa, já plenamente, ainda que no espaço intra-uterino, com sua mãe, e com os demais, caso esses não adotem a covarde conduta do abandono da mulher.

O Estado brasileiro consolidou em seu ordenamento jurídico "mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher", editando a lei nº. 11.340/06, conhecida como a lei "Maria da Penha".

Vamos ler alguns artigos dessa importante lei:

- "Poderá o Juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas: encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento (art. 23, I);

- Caberá ao Ministério Público, sem prejuízo de outras atribuições, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, quando necessário: fiscalizar os estabelecimentos públicos e particulares de atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, e adotar, de imediato, as medidas administrativas ou judiciais cabíveis no tocante a quaisquer irregularidades constatadas (art. 26, II);

- A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios poderão criar e promover, no limite das respectivas competências: centros de atendimento integral e multidisciplinar para mulheres e respectivos dependentes em situação de violência doméstica e familiar; casas-abrigos para mulheres e respectivos dependentes menores em situação de violência doméstica e familiar; programas e campanhas de enfrentamento da violência doméstica e familiar (art. 35, I, II e IV)"

Ora, se assim o é, justamente para que a integridade física da mulher seja protegida, por que, cinicamente, o Estado brasileiro detém-se aqui e, em relação à mulher, que está grávida, que acolhe em si a vida, estimula-a a matar, também a abandonando?

Por que o Estado brasileiro, repito cínico, pela omissão e pela frouxa, errônea e irresponsável justificativa de inserir-se o tema na órbita privada, não tira, como tirou o tema da violência doméstica, portanto também privada, dessa estrita órbita e à mulher gestante não lhe oferece todos os mecanismos oferecidos à mulher fisicamente agredida, para que, assim claramente amparada a mulher, em ambas as situações tenha o direito de viver e fazer viver a vida que consigo traz?

Aguarda-se o governante municipal, estadual e federal que tenha coragem de defender a vida-mulher e a vida-embrião, ou a vida-feto, que a Primeira acolhe em seu ventre.

E você o que pensa sobre o assunto?

3 comentários:

Anônimo disse...

Douglas, adorei você colocar o assunto para debate, mas o tema é mais que difícil de opinar.

Sempre me posicionei contra a legalização do aborto no caso de estupro, chamado de aborto sentimental, pois defendia que o feto seria o único a pagar com pena de morte. Ao mesmo tempo, tentava me colocar no lugar da vítima para saber se continuaria com o mesmo pensamento. Deixei de me colocar no lugar e de tentar me posicionar a favor ou contra, pois acho que cada caso faz a gente mudar um pouco de opinião.
No caso da menor não foi diferente, pois, com certeza, mexeu até com quem é contra o aborto, visto que a menina de 09 anos estava grávida de gêmeos e provavelmente não sobreviveria se levasse a gravidez adiante, já que o útero ainda não tem formação suficiente. Neste caso, a menor podia alegar as duas hipóteses que o Código Penal autoriza o aborto: risco de vida e estupro. Realmente, no caso da menor fica difícil ser contra o aborto, por isso disse no início que a opinião quando o assunto é aborto depende do caso concreto.
Já em relação ao tema excomunhão, sem entrar no tema religião, engraçado o arcebispo não excomungar o estuprador, afirmando que o crime de aborto é mais grave que o estupro. Se pararmos para analisar qual o crime que é mais grave vai ser outro debate sem fim.
Então Douglas e qual a sua opinião nesse difícil tema? Kkkkk abraço.

Anônimo disse...

Wagner Nascimento

Boa tarde Douglas.

Vejo que há muito interesse da imprensa em colocar a posição da Igreja Católica como algo grotesco e inaceitável. Mesmo não sendo católico entendo que o Arcebispo está sendo coerente com o que a instituição a qual pertence defende. Apenas é de lamentar a forma como este trata e se refere as pessoas que em ultima instância tomaram uma dificil e crucial decisão. sou solidário com a criança vitima de abuso e sua família, esperando que a intolerância e a falta de amor sejam feras extintas entre nós. Que saudades de Dom Helder.
Sou totalmente a favor da vida e creio que todos cidadãos de bem o são mas, precidsamos nos conscientizar que o ato sexual não só é um momento de prazer e satisfação ele nos confere responsabilidades que precisam ser assumidas e reguladas para determinar a harmônia. Neste caso em particular da menina houve uma urgência médica algo que foi feito por necessidade e não por irresponsabilidade de quem não se previne, é bom refletir um pouco sobre isto.

Anônimo disse...

Como disse Adriana é uma questão dificultosa de se opinar, a não ser pelo que diz rigorosamente a lei. Se seguirmos o que determina a lei do Estado, os envolvidos no aborto estão 100% corretos em realizarem o ato, não obstante se formos seguir o Direito Canônico o arcebispo está totalmente correto em excomunhar todos os envolvidos. É um fato em que, na minha opinião, não há o que discutir, quem for adepto aos dogmas religiosos estão revoltados com o aborto e apoiam a excomunham, enquanto que os não adeptos questionam o ato do arcebispo e apoiam os médicos do CISAM. Claro que a Igreja tem todo o direito de questionar o aborto, porém, o arcebispo exagerou em suas declarações.